Trump anuncia reforma migratória com apelo para eleições 2020

Por Tatiana Teixeira

Em 16 de maio, o presidente Donald Trump retomou uma de suas promessas da campanha de 2016 (e que será usada para 2020), divulgando seu plano para uma radical reforma migratória. O anúncio não é totalmente novo, nem surpreende, ecoando ideias e projetos insistentemente defendidos ao longo destes dois anos e meio de governo. Na origem do texto, estão Jared Kushner, genro e assessor de confiança do presidente, o conselheiro ultraconservador da Casa Branca Stephen Miller e o conselheiro econômico Kevin Hassett.

“Os democratas estão propondo fronteiras abertas, baixos salários e, sinceramente, um caos sem lei. Nós estamos propondo um plano de imigração que coloca empregos, salário e a segurança dos trabalhadores americanos em primeiro lugar”, defendeu Trump, no pronunciamento no Rose Garden, na Casa Branca.

“Nosso plano atinge dois objetivos cruciais. Primeiro, para a imigração ilegal e deixa a fronteira totalmente segura. E, segundo, estabelece um novo sistema para a imigração legal que protege os salários americanos, promove os valores americanos e atrai os melhores e mais brilhantes do mundo todo”, completou o presidente, referindo-se ao atual “processo de imigração legal disfuncional” que “será, enfim, justo, transparente e promoverá igualdade e oportunidade para todos”.

A proposta divulgada sequer foi escrita na forma de projeto de lei ainda. E, até o momento, nenhum correligionário de Trump se animou a apresentá-la ao Congresso – o que talvez nem venha a acontecer. O texto parece mais um balão de ensaio em sua contínua tentativa de conseguir reformular as bases do debate sobre imigração e estabelecer as mudanças mais expressivas desde o Immigration and Nationality Act, sancionado por Lyndon Johnson em 1965.

Principais pontos da reforma

Em linhas gerais, o ponto central da reforma de Trump continua sendo se concentrar ao máximo em imigrantes altamente qualificados, criar condições que restrinjam a concessão de refúgio, conseguir reduzir a patamares mínimos a imigração por parentesco e acabar com a Visa Lottery. As barreiras físicas na fronteira e o reforço do aparato de vigilância e monitoramento tecnológico, assim como do número de agentes, completam a empreitada para “tornar a América grande de novo”.

Em relação à segurança na fronteira com o México, o maior objetivo de Trump é construir seu muro. Embora o governo afirme que as obras estão em andamento, não há exatamente avanços nesse sentido, mas consertos e reformas de trechos existentes. Em termos de uso de tecnologia e aumento de efetivo, a proposta destaca 33 pontos que devem ser priorizados, após terem sido identificados como mais visados por traficantes de drogas e de pessoas. Na economia, o presidente usa o frouxo argumento de que a redução do fluxo de mão de obra barata terá impacto direto e positivo no salário dos trabalhadores americanos.

Ao propor seu sistema migratório por mérito e defender o ingresso nos EUA apenas dos “melhores e mais brilhantes”, o governo Trump o utiliza como evidência para negar que seja contra os imigrantes. Algumas das medidas da atual administração – mesmo contra os que se encontram em situação legal – sinalizam o contrário. Em 2017, por exemplo, o número de entradas de refugiados atingiu seu nível mais baixo em mais de uma década. Imigrantes qualificados passaram a ter restrições ainda mais estreitas para a concessão de visto, e os que se encontram em condição regular poderão ter benefícios sociais cortados.

A despeito de inúmeros estudos que atestam a contribuição dos imigrantes para a economia – seja pelo pagamento de impostos, pelo consumo, por ocuparem vagas ignoradas e rejeitadas pelos americanos no mercado de trabalho, entre outros motivos –, o presidente os acusa, recorrentemente, de drenarem os recursos públicos e de roubarem empregos da população.

Na proposta de Trump, o número total de ingressos aceitos legalmente (cerca de 1 milhão) se manteria igual, com ênfase, portanto, na mudança de perfil. O visto “Build America” seria dividido nas categorias “talento extraordinário”, “aptidão profissional e especializada” e “estudantes excepcionais”, levando em consideração a idade, o nível de proficiência em Inglês, formação e ofertas de trabalho no país. O presidente espera pular o percentual de vistos concedidos nesta categoria dos atuais 12% para 57%, ou mais. Sobre as famílias, a meta é priorizar a entrada de filhos e cônjuges e romper o que o governo chama, pejorativamente, de “cadeia migratória”. Aqui, o Executivo de Trump propõe uma redução dos atuais 66% para 22%. No caso dos demandantes de refúgio, que hoje chegam a 22%, a meta do governo seria cair para 10%.

Críticas de ambos os lados

Críticas de republicanos e democratas surgiram logo após seu pronunciamento – não apenas a seu conteúdo, mas a seu caráter eleitoreiro. Correligionários do magnata nova-iorquino e associações e grupos favoráveis à política de fechar as portas aos imigrantes consideram que o texto é insuficiente em seu rigor e não reduz o número total de entradas legais. Também veem com ceticismo a possibilidade de que, mesmo neste formato, ele tenha apoio bipartidário para ser aprovado, se enviado para o Congresso. Já os democratas consideram a proposta apenas um tema para cerrar o discurso e as fileiras do GOP em torno da reeleição, assim como um aceno e um agrado para a base eleitoral de Trump.

A percepção dos adversários de Trump não é desprovida de sentido. Uma pesquisa da Associated Press com o NORC Center for Public Affairs Research feita em dezembro de 2018 indicou um aumento entre os que consideram a imigração um dos cinco principais problemas do país – junto com economia, sistema de saúde, meio ambiente e clima. Do total de entrevistados, 49% disseram esperar que o governo trate do assunto em 2019, contra 27% com essa mesma expectativa em dezembro de 2017. Essa tendência foi observada tanto entre republicanos (de 42% para 65%) quanto entre democratas (de 20% para 37%).

“Se, por alguma razão, possivelmente política, a gente não conseguir fazer os democratas aprovarem esse plano de segurança máxima baseado no mérito, então, vamos conseguir aprová-lo imediatamente depois da eleição, quando pegarmos a Câmara de volta, mantivermos o Senado e, claro, a Presidência”, afirmou Trump ainda no Rose Garden. “Uma das razões pelas quais nós vamos vencer é por causa da nossa política imigratória forte, justa e pró-América”, completou, no mesmo evento.

Para a presidente da Câmara de Representantes, a democrata Nancy Pelosi (D-CA), a Casa Branca “reempacotou o pior de seus últimos planos de imigração fracassados”. A congressista disse ainda que “não é nem de longe uma proposta séria”.

“O que o presidente está propondo é uma agenda xenófoba, anti-imigrante que, se aplicada às gerações passadas, teria impedido milhões de imigrantes europeus e asiáticos de contribuírem para o nosso país”, declarou em uma nota a representante Linda Sanchez (D-CA), presidente da Força-Tarefa de Imigração da bancada hispânica no Congresso.

A Câmara de Comércio foi receptiva, mas ressaltou que ainda há “muito trabalho” a fazer em “inúmeras questões”. Grupos de defesa dos direitos dos imigrantes reivindicaram, por sua vez, mais atenção à ajuda humanitária.

Lacunas

Alguns pontos não foram abordados na proposta. Entre eles, está uma das prioridades democratas quando o assunto é imigração: o que fazer com os chamados “Dreamers”. Hoje, esse grupo formado por jovens que ingressaram ilegalmente no país quando crianças chega a pelo menos 3,8 milhões de pessoas. Ao tomar posse, o presidente Trump revogou o programa Deferred Action for Childhood Arrivals (DACA), adotado por Barack Obama. Agora em suspenso por determinação da Justiça, o DACA funcionou como uma solução temporária para evitar a deportação dos cerca de 800 mil jovens beneficiados pelo programa.

Os democratas garantem que qualquer reforma migratória que não trate desta questão não terá apoio do partido. Muitos republicanos também são sensíveis, como a senadora moderada Susan Collins (R-ME), que promete não votar em nenhum projeto que não aborde o DACA, ou solução similar.

Também não há informações sobre como o governo vai lidar com os cerca de 11 milhões de imigrantes em situação irregular, um dos pontos mais polêmicos sobre o tema. Enquanto boa parte dos republicanos é contrária ao que consideram uma concessão de “anistia”, democratas defendem um longo caminho para a obtenção de cidadania para aqueles que já vivem no país. Na proposta de Trump, não há nenhuma menção a isso. Tampouco se fala dos mais de 300 mil estrangeiros que vivem de forma legal no país no âmbito do Temporary Protected Status, programa por meio do qual os EUA acolhem cidadãos de países atingidos por desastres naturais e conflitos.

O último grande movimento bipartidário no Congresso para aprovar uma ampla reforma migratória foi em 2013, no governo Obama. Aprovada no Senado, não sobreviveu à votação na Câmara de Representantes. Esforços na gestão de George W. Bush também fracassaram.

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