INCT-INEU participa de encontro no Reino Unido

INCT-INEU participa da 13ª Conferência Anual do Grupo de Trabalho em Política Externa dos EUA da Associação Britânica de Estudos Internacionais

por Angelo Raphael Mattos*

Nos dias 4 e 5 de setembro, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU) participou da 13ª Conferência do Grupo de Trabalho especializado em política externa dos EUA da Associação Britânica de Estudos Internacionais (BISA, na sigla em inglês). O evento, que teve lugar na Liverpool John Moores University (LJMU), no Reino Unido, contou com mais de dez painéis em que foram discutidos temas como o processo decisório em política externa norte-americana na área de segurança e defesa, o uso crescente de drones em conflitos desde o governo Obama, segurança energética dos EUA, além de assuntos mais voltados para a política comercial, como as especificidades do governo Trump e o liberalismo, relações EUA-China, e a renegociação do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA).

Nas mesas redondas, foram discutidos temas centrais da agenda de segurança de Washington, além da visão do mundo sobre a política externa dos EUA em sentido amplo. Debateram, durante o evento, palestrantes como o Prof. Dr. Geraldo Zahran, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e pesquisador no INCT-INEU, que discutiu perspectivas do liberalismo na atual ordem internacional de poder, a Profª Drª Leslie Vinjamuri da Universidade de Londres e do Instituto Real de Relações Internacionais – Chatham House –, a Profª Ruth Deyermond, da King’s College London, especialista em Rússia, o Prof. Dr. Xin (Calvin) Liu da LJMU, especialista em China, o Prof. Dr. Adam Quinn, da Universidade de Birmingham, especialista em política externa dos EUA, a Profª Drª Maria Ryan, da Universidade de Nottingham, também especialista em política externa norte-americana, e o Prof. Dr. Dimitrios Anagnostakis, da Liverpool Hope University, especialista nas relações Estados Unidos-União Europeia, além do anfitrião, o Prof. Dr. Matthew Allan Hill.

No painel sobre as diretrizes econômicas da política externa dos EUA, foram discutidos temas como o governo Nixon, a reforma monetária internacional, a hegemonia dos EUA no sistema internacional, a lógica do capital nas relações EUA-China, e a promoção de dispositivos sobre direitos e obrigações trabalhistas nos acordos comerciais dos EUA, esse último apresentado pelo egresso do mestrado do PPG San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP) Rodrigo Fagundes Cézar, hoje doutorando em Relações Internacionais e Ciência Política pelo Instituto Universitário de Altos Estudos Internacionais e do Desenvolvimento, em Genebra, na Suíça. O trabalho escrito por mim em coautoria com a Profª Drª Karina L. P. Mariano – também pesquisadores no INCT-INEU – abordou o Executivo e o Legislativo na renegociação do NAFTA, além de associações e grupos domésticos que se manifestaram a favor da permanência dos EUA no bloco regional de livre comércio.

O artigo sobre o NAFTA suscitou questões relacionadas também ao cumprimento de compromissos trabalhistas no âmbito do acordo. Além dos aspectos eminentemente comerciais, o NAFTA compreende outros compromissos regionais e de implementação doméstica pelos Estados Partes nas esferas trabalhista e ambiental, na tentativa de um comércio justo e equilibrado. O acordo suplementar no âmbito do NAFTA, denominado Acordo Norte-Americano sobre Cooperação Laboral (NAALC, na sigla em inglês), objetiva promover a efetivação de leis trabalhistas domésticas e incentivar a transparência na implementação dessas normas.

O NAALC estabeleceu a chamada Comissão Trinacional para a Cooperação Laboral, composta por um Conselho Ministerial e uma secretaria administrativa. Somado a isso, cada Estado membro criou, domesticamente, um Escritório Administrativo Nacional (NAO, na sigla em inglês), no âmbito do qual o ministro do trabalho de cada país representa uma ponte entre as questões trabalhistas de seu Estado e dos outros Estados Partes, além de ser ponto de contato com a secretaria. O intuito na criação dessas instâncias domésticas sob os auspícios do NAFTA, segundo o relatório do United States Trade Representative – USTR (2016), é dar publicidade e transparência às questões trabalhistas e disponibilizar informações à Secretaria e aos outros países parceiros no NAFTA. Além disso, os NAOs, em conjunto com o secretariado, podem colocar em prática as atividades promovidas pelo Conselho.

Em 2016, o Departamento do Trabalho dos EUA (DOL, na sigla em inglês) e a Secretaria do Trabalho e Previdência Social do México (STPS) publicaram um relatório conjunto que resumia as atividades educacionais e de extensão realizadas no ano anterior sobre os direitos dos trabalhadores nos EUA, no que se refere, portanto, aos tipos de visto H-2A. e H-2B. “Nos EUA, o DOL realizou 29 eventos de divulgação em 15 estados, alcançando mais de 2.300 trabalhadores e 1.000 empregadores.” Nesse sentido, apesar dessas instâncias no âmbito do NAFTA, a crítica do governo Trump residia no fato de que, embora houvesse esses acordos sob o guarda-chuva do NAFTA, a fraca coalização sindical no México não pressionava adequadamente por melhores salários, o que estimulava o deslocamento de empresas norte-americanas e a consequente perda de postos de emprego nos EUA, além do déficit na relação comercial.

As intenções do governo Trump na esteira da renegociação do acordo de livre comércio entre os EUA e seus vizinhos parecem ter sido conjugadas com o que desejava parte expressiva dos grupos domésticos e dos congressistas que se manifestaram por meio de envio de cartas ao presidente, isto é, um novo acordo que contemplasse condições mais favoráveis aos EUA no livre comércio, ao invés de acordo algum.

Recentemente, o ganho político de Trump na região materializou-se em um novo acordo que poderá substituir o NAFTA. O chamado U.S.-Mexico-Canada Agreement (USMCA) ainda precisa passar pelo crivo congressual dos três países. Além disso, as eleições legislativas em novembro, nos EUA, aumentam as incertezas. Diferentemente do NAFTA, cujo texto do acordo não previu prazo para sua extinção, o USMCA será revisto pelos três Estados Partes a cada seis anos, e poderá perder validade dentro da década seguinte após a revisão, bastando a manifestação de um de seus membros, o que coloca o acordo sob a vontade política do governo em exercício. No que se refere à crítica dos EUA com relação aos baixos salários pagos no México, o que estimula a exportação de empregos, o novo acordo busca promover maior proteção aos trabalhadores mexicanos com o intuito de incentivar o fortalecimento dos sindicatos locais.

Com efeito, além das questões comerciais relativas à política externa dos EUA, o evento da BISA suscitou importantes questionamentos e trouxe boas discussões relacionadas às incertezas próprias da reconfiguração de poder no sistema internacional e o papel dos EUA nesse processo, em um contexto global de recrudescimento do protecionismo, ou, melhor, da política estadunidense do Fair Trade desenvolvida, sobretudo, desde os anos 1980, e de opções bilaterais que têm deixado em stand by iniciativas multilaterais importantes como as negociações no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Nesse sentido, o INCT-INEU, importante centro difusor de pesquisa sobre os EUA no Brasil, também possibilita o intercâmbio científico entre pesquisadores de diferentes países, o que amplia a rede de contatos entre eles e contribui com o enriquecimento das pesquisas nacionais, a exemplo do apoio que recebi para participar deste evento na LJMU. Sobre os desafios da pós-graduação, como a inserção no estágio e na docência, e da importância da cooperação em ciência, tratou o Prof. Hill em um debate que encerrou o evento em Liverpool. A ênfase dele foi justamente na valorização da cooperação e do intercâmbio acadêmico como base fundamental da construção e da disseminação do conhecimento científico de ponta nas ciências humanas, que é o caso da produção oriunda das pesquisas no âmbito do INCT-INEU.

 

*Doutorando e mestre em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP). Pesquisador no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU), com apoio CAPES.

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