Super Terça: Biden é imbatível junto a negros

Resultado surpreendente também demonstra que partidos e lideranças ainda importam na política americana

Por Felipe Loureiro*

As vitórias de Joseph Biden nas primárias democratas da Super Terça iluminam aspectos importantes sobre o futuro das eleições presidenciais nos Estados Unidos.

No último sábado (29), o estado da Carolina do Sul levantou uma barreira formidável contra pré-candidatos democratas que não demonstram apoio expressivo junto ao eleitorado negro do partido.

Antes da Carolina do Sul, muitos já davam Biden como derrotado. Isso por causa de seu desempenho sofrível nas disputas de Iowa e New Hampshire, além de um distante segundo lugar em Nevada, atrás de Bernie Sanders.

Sanders, ao contrário, parecia rumar imbatível para a Super Terça: embalado por vitórias em duas das três disputas iniciais, o senador de Vermont liderava pesquisas em muitos estados, inclusive no Sul do país, região com significativa proporção de negros.

Tudo isso mudou após a expressiva vitória de Biden na Carolina do Sul, estado onde negros perfazem 60% dos eleitores democratas. Em apenas três dias, a breve vantagem que Sanders apresentava evaporou, resultando numa avalanche pró-Biden nos estados sulistas da Super Terça.

O ex-vice-presidente provou que é imbatível junto à maior e mais coesa base eleitoral do Partido Democrata. Se quiserem barrar Donald Trump nas eleições de novembro, os democratas precisarão mobilizar seu eleitorado negro. A Super Terça indicou que Biden consegue fazer isso.

A surpreendente mudança de cenário nas primárias também demonstra outro aspecto importante: o de que partidos e lideranças partidárias ainda importam na política norte-americana.

Depois da inesperada vitória de Trump nas primárias de 2016, quando se tornou candidato à Presidência apesar da fortíssima e quase generalizada oposição de lideranças do Partido Republicano à sua candidatura, muitos estudiosos concluíram que chefes partidários tinham perdido poder de influência perante eleitores.

A Super Terça mostrou que não é bem assim, pelo menos não entre os eleitores democratas.

A expressiva vitória de Biden na Carolina do Sul, aliada ao pavor do establishment democrata à ascensão eleitoral de Sanders, desencadeou uma avalanche de apoios de lideranças partidárias ao ex-vice-presidente.

Em um intervalo de apenas 24 horas, dois pré-candidatos –Pete Buttigieg e Amy Klobuchar–, que tinham apresentado bom desempenho nas primeiras disputas, desistiram das suas candidaturas e também anunciaram apoio a Biden.

As surpreendentes vitórias de Biden em Minnesota de Amy Klobuchar e no progressista estado de Massachussets de Elizabeth Warren mostraram o poder de influência que lideranças democratas ainda têm sobre suas bases eleitorais.

E tudo isso sem que Biden tivesse feito campanha ou investido na maior parte dos estados da Super Terça, diferentemente de Sanders, que colocou muito dinheiro, energia e pessoal nos palcos em disputa, tendo colhido poucos bons resultados, entre os quais uma vitória crucial na Califórnia.

Por mais que as primárias democratas ainda estejam longe de uma definição, a Super Terça mudou o cenário: Biden tornou-se o favorito da disputa, mostrando importantes qualidades para vencer Trump em novembro.

Caso seja de fato o candidato, resta apenas saber se Biden terá sucesso no que Hillary Clinton não teve em 2016: motivar os apoiadores de Sanders a esquecer as feridas abertas nas primárias, mobilizando-os a votar para derrotar Trump.

 

 

* Felipe Loureiro é professor do Instituto de Relações Internacionais da USP e pesquisador do Instituto Nacional de Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU).

** Este texto é uma republicação da análise publicada pelo autor no jornal Folha de S. Paulo, em 4 mar. 2020. A versão original com infografia está disponível aqui.

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