Por reforma migratória, Trump ameaça fechar fronteira com México

Por Tatiana Teixeira

Depois de ameaçar, em 29 de março, fechar a fronteira com o México (ou pelo menos seções dela), o presidente Donald Trump recuou menos de uma semana depois, no dia 2 de abril. Não baixou o tom, porém, e garantiu que pode vir a adotar a medida, se o Congresso não aprovar a reforma migratória e/ou se o governo mexicano não melhorar seus controles na fronteira, barrando os cidadãos centro-americanos que atravessam o país para chegar aos Estados Unidos.

“Segurança é mais importante para mim do que comércio”, disse o empresário nova-iorquino, rebatendo as críticas. “Vamos ter uma fronteira forte, ou vamos ter uma fronteira fechada”, frisou. “Se não chegarmos a um acordo com o Congresso, a fronteira será fechada. 100%. Ou vamos fechar trechos grandes na fronteira. Talvez não toda. Mas é o único jeito de ter uma resposta, e eu estou totalmente disposto a fazer isso”, prometeu.

“O México precisa usar suas fortes leis migratórias para parar as muitas milhares de pessoas que tentam entrar nos EUA. Nossas áreas de detenção estão no limite & nós não vamos mais receber ilegais. O próximo passo é fechar a Fronteira! Isso também vai ajudar a gente a parar o fluxo de Drogas do México!”, tuitou Trump, que, além dos centros de detenção lotados, volta e meia se refere a um sistema judiciário sobrecarregado com processos envolvendo migrantes.

Segundo a secretária de Imprensa da Presidência, Sarah Sanders, Trump não trabalha com um cronograma específico ainda e, no momento, o Conselho de Assessores Econômicos da Casa Branca estuda os efeitos de um potencial fechamento da fronteira ao sul. Sinalizando que o anúncio de Trump está sendo levado a sério, seu principal conselheiro para Assuntos Econômicos, Larry Kudlow, informou que, agora, buscam-se opções que minimizem o impacto de um possível shutdown, sem obstruir as principais cadeias de abastecimento aos Estados Unidos. A pergunta não seria mais se é plausível, mas sim como fazer.

Fechamento da fronteira

A reação negativa ao fechamento da fronteira com o México partiu de vários setores, e não apenas da oposição democrata. “Fechar a fronteira teria um impacto econômico potencialmente catastrófico para o nosso país, e eu espero que a gente não vá fazer esse tipo de coisa”, afirmou o líder da maioria no Senado, o republicano Mitch McConnell (R-KY). Usando praticamente as mesmas palavras, o líder da minoria na Casa, o senador democrata Charles Schumer (D-NY), referiu-se a um “potencial desastre econômico”.

Na mesma linha, o vice-presidente executivo da Câmara Americana de Comércio, Neil Bradley, advertiu que seria “destrutivo para nossa economia” e disse que o grupo manifestou sua “preocupação” diretamente para a Casa Branca. “Qualquer ação que paralise o comércio na fronteira seria prejudicial para a economia americana e, em particular, para a indústria automotiva”, reclamou o presidente do American Automotive Policy Council, Matt Blunt. Segundo este último, “o acesso ao mercado mexicano e a integração norte-americana são cruciais para as operações nos Estados Unidos”.

De acordo com a Câmara Americana do Comércio, a troca comercial bilateral passa de US$ 1,7 bilhão por dia, com mais de meio milhão de trabalhadores em condição legal, consumidores, estudantes e turistas cruzando a fronteira diariamente. Alguns dos produtos mais afetados seriam abacate, cerveja, carros (setor especialmente atingido) e aparelhos de televisão, entre outros manufaturados. Um fechamento total da fronteira ao sul seria uma decisão inédita e teria um impacto direto para o consumidor americano em várias áreas, refletindo-se na escassez de produtos e na alta dos preços. O México é o terceiro maior parceiro comercial dos EUA, atrás de Canadá e China.

Pressão sobre a América Central

Também como medida de força na questão migratória e destoando de um padrão histórico de ação dos EUA no continente, Trump anunciou, em 29 de março, o corte de ajuda humanitária para El Salvador, Guatemala e Honduras, além da possibilidade de nomear um “czar da imigração” para lidar com a questão. Continuam se formando, portanto, cortinas de fumaça por parte de um governo que, assim como já aconteceu em outras administrações, não sabe como lidar com o fluxo migratório dos países vizinhos e também não consegue planejar, implementar e estabelecer políticas públicas viáveis, que não passem pela criminalização do tema.

“Nenhum dinheiro vai mais para lá”, declarou Trump. “Estamos dando uma enorme ajuda para eles. Paramos de pagar” completou, referindo-se a um montante de até US$ 700 milhões.

Entre outras atribuições, esses recursos são usados para apoiar ações policiais contra gangues locais, assim como em programas de desenvolvimento e para ajuda humanitária. Não está claro de que forma cortar essa verba contribuirá para diminuir o fluxo migratório centro-americano rumo aos EUA, nem se sabe ainda como esse corte será aplicado na prática. A decisão abrupta aponta mais para uma justificativa política do que de segurança, ou de ordem econômica, por parte do governo Trump.

O senador Bob Menendez (D-NJ), que integra o Comitê de Relações Exteriores desta Casa, considerou a decisão “irresponsável” e “imprudente”, alegando que a ajuda externa fornecida pelos EUA promove “nossos interesses estratégicos e financia iniciativas que protegem cidadãos americanos”. Cortar ajuda “é um tiro no pé”, corroborou a diretora de segurança cidadã do Washington Office on Latin America (Wola), instituição que monitora a distribuição desses recursos.

Um dia depois do anúncio de Trump, durante visita oficial a El Salvador, uma delegação de congressistas democratas também criticou o anúncio. Participavam da comitiva os representantes Eliot L. Engel (D-NY), presidente do Comitê de Relações Exteriores da Câmara; Jerrold Nadler (D-NY), presidente do Comitê Judiciário; Zoe Lofgren (D-CA), presidente do Subcomitê do Judiciário para Imigração e Cidadania; Pramila Jayapal (D-WA), vice-presidente do Subcomitê para Imigração e Cidadania; e Adriano Espaillat (D-NY), também membro do Comitê de Relações Exteriores.

“No momento em que visitamos El Salvador para avaliar a importância da ajuda dos Estados Unidos à América Central para lidar com as principais causas da migração de crianças e de famílias, estamos extremamente desapontados de saber que o presidente Trump pretende cortar a ajuda para a região. A abordagem do presidente é totalmente contraproducente. Resultará apenas em mais crianças e famílias sendo forçadas a fazer a perigosa travessia rumo à fronteira do México com os Estados Unidos. Vamos trabalhar com nossos colegas no Congresso para fazer tudo que estiver em nosso poder para fazer o presidente recuar dessa equivocada abordagem para a América Central”, afirmou o grupo, em uma nota.

A tentativa por parte do presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, e de outros da região de convencer Washington a investir na América Central e no sul do México para estimular o desenvolvimento socioeconômico, gerar emprego e reduzir a violência local como forma de diminuir a emigração não parece estar funcionando, nem parece contar com o apoio da administração Trump.

As medidas anunciadas até agora pelo atual Executivo nesta área – travel ban, separação de famílias de imigrantes em situação ilegal, o decreto de emergência nacional para obter um remanejamento de verbas para reforçar a segurança na fronteira, entre outras – foram rapidamente contestadas na Justiça em diferentes estados e por diversas organizações, em meio às críticas de preconceito, xenofobia e de violação dos direitos humanos. Uma de suas principais promessas de campanha, o muro a ser construído na fronteira com o México é um ponto bastante contencioso da “política” migratória atual.

De acordo com a Patrulha de Fronteira e Alfândega dos Estados Unidos (CBP, na sigla em inglês), em fevereiro passado, 76.103 pessoas foram detidas na fronteira, um aumento em relação às 58.295 retidas em janeiro, e em dezembro de 2018, com 60.775.

Migração e a política do medo

Se, com George W. Bush, a Guerra Global ao Terror era largamente usada como elemento de unidade nacional no período que se seguiu ao 11 de Setembro, em Trump, a questão migratória parece estar sendo empregada como isca para manter o apoio da base eleitoral que ajudou a levá-lo para a Casa Branca. Um problema que existe para não ser resolvido, funcionando, na verdade, como um elemento de distração a cada nova confusão que aparece no governo.

De acordo com uma pesquisa feita pelo Pew Research Center em janeiro deste ano, 58% dos americanos se mantêm contrários à construção do muro, enquanto 40% são favoráveis à proposta. A questão – mostra a sondagem – ganha cada vez mais cores partidárias, com um percentual recorde de apoio republicano (82%) e, inversamente, com um piso (também recorde) de aprovação entre os democratas (6%). Entre os republicanos, 69% acreditam que a construção do muro vai ajudar a conter a imigração clandestina, contra 70% dos democratas que não veem essa relação.

Depois de mais de dois anos no poder, Trump ainda segue um modus operandi que se tornou conhecido. Primeiramente, o presidente lança uma ameaça sobre um tema qualquer, cumpre esta ameaça e recua na sequência, reagindo a ações judiciais, a pressões políticas e de setores econômicos, ou porque começaram as negociações entre as partes envolvidas no imbróglio. Ou então recua antes mesmo de as negociações começarem, como uma maneira de estabelecer suas “linhas vermelhas”. Viu-se os dois tipos de movimento, por exemplo, na questão comercial com a China, no tema nuclear com a Coreia do Norte e na queda de braço com seus parceiros do então Acordo de Livre-Comércio da América do Norte (Nafta, na sigla em inglês), México e Canadá. Neste já conturbado ano pré-eleitoral, parece que essa dinâmica vai-se intensificar, sobretudo, nas pautas domésticas, como na imigração e na área da Saúde.

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