China e Rússia

Visita de Yellen à China corrobora preocupação dos EUA em fortalecer diálogo bilateral

Yellen em entrevista coletiva em 8 jul. 2023, na Embaixada dos EUA em Pequim (Fonte: Embaixada dos EUA na China)

Por Aline Regina Alves Martins e Vitória Vieira Moreira de Jesus* [Informe OPEU]

No dia 6 de julho, a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, fez uma visita a Pequim, na China, com a intenção de iniciar um estreitamento de laços com o país. As duas nações estão vivenciando períodos de tensões nos setores comercial, financeiro e tecnológico, além de discordâncias em relação aos assuntos de segurança nacional. Nessa visita, Yellen ressaltou a importância de uma competição saudável, com medidas e políticas que possam beneficiar ambos os lados. Ela também destacou a importância da comunicação e da cooperação entre os dois Estados para solucionar seus próprios problemas, mas também para enfrentar questões de âmbito global.

É importante pontuar que, apesar da abertura ao diálogo e das recentes tentativas de aproximação, ainda são baixas as expectativas com a possibilidade de reais mudanças. De um e de outro lado, prevalece o ceticismo quanto à melhora das desavenças.

Essa tentativa de aproximação foi antecedida pela visita do secretário de Estado americano, Antony Blinken, que viajou em junho para Pequim, depois de quase cinco anos, para reforçar a necessidade de uma comunicação aberta entre os países e a importância de se evitar futuros conflitos. O chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi, ressaltou, por sua vez, a necessidade de “escolher entre o diálogo e o confronto, a cooperação ou o conflito”, acrescentando que também espera a volta de um relacionamento saudável com os Estados Unidos. Apesar das divergências ainda existentes, há a intenção de manter relações estáveis, dialogadas e equilibradas, em que ambos os Estados comuniquem suas preocupações e interesses de forma aberta.

As principais divergências que podem ser consideradas pivô dessas tensões são as relações com Taiwan, com a Rússia e as restrições comerciais na produção de semicondutores. Em 2022, a ilha de Taiwan recebeu a visita da então presidente da Câmara dos Representantes (Deputados) americana, Nancy Pelosi, que declarou interesses e afinidades com o território. Tal postura gerou descontentamento da China, que tem desavenças históricas com a ilha e com sua forma de governo estabelecida no século XX.

Profile: Alicja Bachulska | ECFR

Alicja Bachulska (Fonte: ECFR)

Já as relações comerciais e de assistência existentes entre Rússia e China geram insatisfação norte-americana. O governo chinês se coloca atualmente como um grande parceiro comercial russo, com as lacunas deixadas pelo afastamento americano. De acordo com Alicja Bachulska, do European Council on Foreign Relations, a China amplia seu espaço no comércio da Rússia, ganhando grande mercado exportador, mas também importador de bens russos mais baratos, que não são mais amplamente direcionados à Europa.

Ademais, cresce a cooperação monetária entre China e Rússia, com o fortalecimento do Sistema de Pagamento Interbancário Transfronteiriço (paralelo à Sociedade para as Telecomunicações Financeiras Interbancárias Mundiais, controlada pelos EUA) e de acordos de swap cambiais. Como os EUA reprovam essa aproximação, Yellen mencionou em sua visita que se evite fornecer ajuda à Rússia em um contexto de guerra (com a Ucrânia), relembrando as sanções que podem ser aplicadas para reprimir esse comportamento.

Já o mercado de semicondutores tem deixado ambos os governos apreensivos, devido a cada um buscar seguir políticas de interesse nacional, que não necessariamente sejam de benefício bilateral. Nesse sentido, os Estados Unidos adotaram uma restrição para o fornecimento de tecnologia para a produção chinesa de semicondutores. O Departamento de Comércio declarou a intenção de interromper as remessas de chips feitos para Inteligência Artificial e chips para clientes na China. E os chineses, que buscam se desenvolver nessa área, sentem-se prejudicados pela tentativa americana de interrupção de seus projetos. Como resposta, o Partido Comunista Chinês propôs restrições às exportações para os EUA de dois metais importantes (gálio e germânio) para a produção de semicondutores. Essa retaliação chinesa preocupou o governo norte-americano que buscou, com a visita da secretária Janet Yellen, demonstrar que Washington não aceitará de forma branda essas medidas. Ainda assim, para além da insatisfação, os EUA insistiram, conforme dito acima, na importância de se tentar melhorar as relações bilaterais.

Outrossim, a representante de Washington expôs que esse embate não é saudável para os dois países nem para a economia global, que sofre o impacto das decisões tomadas por ambos os governos e vê sua estabilidade ser colocada em risco. A secretária teve como intenção pedir maior transparência com relação às ações chinesas, melhorar as linhas de comunicação e buscar coordenação nas questões econômicas e financeiras. 

Do mesmo modo, Pequim também disse buscar maior tranquilidade e uma competição mais justa entre os países. O Ministério chinês das Finanças espera dos EUA medidas mais concretas para um ambiente favorável ao desenvolvimento das relações econômicas bilaterais. No encontro com Yellen, o primeiro-ministro chinês, Li Qiang, ressaltou que a China não desafia, nem coloca os EUA em risco, acrescentando que o crescimento chinês é uma oportunidade e que trará ganhos bilaterais.

Encontro do premiê chinês, Li Qiang, com a secretária do Tesouro americano, Janet Yellen, em Pequim (Fonte: CCTV)

A secretária do Tesouro também mencionou a proposta de cooperação em outras áreas, como em temas relacionados às questões climáticas e à estabilidade monetária e financeira internacional. Por fim, abordou como injustas as ações restritivas e barreiras realizadas por Pequim e manifestou a insatisfação americana, por meio de críticas e pedidos de reformas.

Apesar do potencial de fortalecimento das relações sino-americanas após a visita, a China ainda se encontra descrente com relação à mudança americana, considerando as divergências que ainda existem e a dificuldade norte- americana de abandonar seus projetos de “interesses nacionais”, em prol da cooperação e desenvolvimento das relações bilaterais sino-americanas. Já para os EUA, na fala de Yellen, a mensagem principal do discurso foi de manter a estabilidade nas relações com os chineses, reconhecendo a dependência mútua entre as duas maiores economias do planeta e afirmando que “o mundo é grande o suficiente para ambos os países prosperarem”.

 

* Aline Regina Alves Martins é docente de graduação e pós-graduação da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisadora do INCT-INEU. Contato: alinermartins@ufg.br e LinkedIn.

Vitória Vieira Moreira de Jesus é graduanda em Relações Internacionais da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisadora bolsista de Iniciação Científica (PIBIC/INCT-INEU). Contato: vitoria_vieira@discente.ufg.br.

** Primeira versão recebida em 20 jul. 2023. Revisão e edição final: Tatiana Teixeira. Este Informe OPEU não reflete, necessariamente, a opinião do OPEU, ou do INCT-INEU.

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