Trump decide por retirada militar imediata da Síria

Surpresa para uns, mais do que esperada para outros, a retirada tem pouco a ver com a Síria em si.

 

por Solange Reis

 

De forma repentina, o presidente Donald Trump anunciou a retirada de suas tropas da Síria. Por meio de um tuíte, no dia 19, o republicano disse ter cumprido a missão de derrotar o Estado Islâmico e não ver mais razão para a presença militar no país.

Cerca de 2 mil soldados e toda a parafernália material já começaram a ser retirados, e a expectativa é de conclusão do processo em até trinta dias.

Autoridades militares e conselheiros civis não conseguiram convencer Trump do que consideram um erro estratégico e um desagrado a aliados como Reino Unido e Israel. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, sintetizou que “é claro que se trata de uma decisão americana”. Já o governo britânico lançou uma nota oficial sobre a necessidade de combate permanente ao Estado Islâmico.

Para a Arábia Saudita, a saída representa um banho de água fria na guerra insana travada no Iêmen com a ajuda dos Estados Unidos. Sobretudo depois que senadores em Washington aprovaram na sexta-feira, 14, uma resolução contra o envolvimento americano no conflito do Iêmen.

Figuras no Pentágono temem que a medida seja vista pelos curdos como uma traição, o que poderá custar o apoio destes e de outros grupos a futuras investidas dos Estados Unidos na região.

Enquanto Trump mirava apenas a derrota do Estado Islâmico, os estrategistas militares veem na Síria uma disputa geopolítica de grandes proporções. Analistas e diplomatas encaram a decisão como uma cessão de terreno aos rivais Rússia e Irã, além de um erro de graves consequências para a política dos Estados Unidos no Oriente Médio.

Mesmo a opinião do todo-poderoso conselheiro de segurança nacional, John Bolton, teria sido, em tese, desprezada por Trump. Recentemente, Bolton comentou que a manutenção de tropas na Síria seria fundamental para conter a influência iraniana.

Tampouco faltaram críticas no campo político. A líder democrata na Câmara, Nancy Pelosi, acusou o presidente de agir por interesse próprio e não em nome da segurança nacional. Após encontro com o vice-presidente Mike Pence, o medalhão republicano, Lindsey Graham disse, em tom de desabafo, “Iraque, tudo de novo”. Graham faz parte de um grupo bipartidário de senadores que pediu ao presidente pela revogação da retirada.

Em contrapartida, há quem concorde com Trump. Após o comunicado da Casa Branca, o ministro das relações exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, afirmou que a solução da guerra poderá finalmente ter início.

Coincidentemente ou não, no dia anterior, Lavrov havia se encontrado com suas contrapartes turca e iraniana, respectivamente, Mevlut Cavusoglu e Javad Zarif, e o enviado especial da ONU para discutir a formação de um comitê constitucional na Síria. Naquele dia, o russo afirmou que a presença dos Estados Unidos era um entrave às negociações de paz entre as partes.

Segundo o analista do site conservador, The American Conservative, o anúncio não foi tão surpreendente. Parte dos militares e dos assessores de Trump soube previamente e até acompanhou as negociações entre a Casa Branca e o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan. A última conversa entre os dois líderes teria sido na sexta-feira, 14, a respeito do apoio americano aos curdos, que tem sido um ponto nevrálgico na relação dos Estados Unidos com a Turquia.

Para outro especialista, Daniel Larison, sair da Síria foi a única boa medida de Trump em política externa desde que assumiu a presidência. Além de ilegal, a presença americana no país não traz nenhum benefício à segurança nacional, alega Larison.

Outro que aprova a decisão é o ex-embaixador dos Estados Unidos na Síria, Robert Ford, para quem o conflito é uma guerra civil que escapa à solução internacional. Ford acrescentou que, ademais, os ataques aéreos americanos continuarão possíveis.

Para o bem da verdade, Trump nunca escondeu que pretendia tirar os soldados de lá. Em março, o presidente já anunciava a intenção, tão logo o Estado Islâmico fosse derrotado. O importante agora é entender o porquê de, efetivamente, o fazer nesta semana.

Sem que tenha ocorrido nenhum fato recente no desmonte do Estado Islâmico, que já vem enfraquecido desde a entrada de outros países no conflito sírio e da atuação dos Estados Unidos no Iraque, talvez essa explicação passe pelo cerco jurídico em torno do presidente dentro de casa. Mais uma vez no atual governo, os assuntos externos parecem servir como uma cortina de fumaça para o caos doméstico.

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