Trump abriu uma caixa de Pandora no Oriente Médio

por  M K Bhadrakumar
Artigo traduzido do Indian Punchline*

Não se vê triunfalismo por parte de Estados Unidos, Reino Unido ou França a respeito do ataque com mísseis contra a Síria na sexta-feira.

O clima é bastante defensivo. Na verdade, ainda faltam evidências sobre os supostos ataques químicos em Douma, que foi a desculpa para o lançamento dos mísseis. Tampouco se fala sobre a eficácia do ataque com mísseis em termos militares.

Pelo contrário, Damasco está de bom humor. O 14 de abril foi considerado um dia de comemorações. Afinal, as forças sírias enfrentaram sozinhas o ataque do Ocidente. Os relatórios russos ressaltam que o sistema de defesa aérea sírio foi altamente eficaz. No sábado, o ministério da Defesa disse, em Moscou, que não houve vítimas sírias. Moscou atesta que os sírios derrubaram 71 de um total de 103 mísseis disparados pelos Estados Unidos, Reino Unido e França. Nem Washington, nem Londres e Paris contradisseram a avaliação russa até agora.

O presidente Donald Trump é a voz solitária sobre o ataque com mísseis. Ele tuitou bombasticamente:

“Estou tão orgulhoso dos nossos grandes militares que, depois de gastos os dólares devidamente aprovados, serão os melhores que o nosso país já teve. Não haverá nada nem ninguém que se compare!

Mas Trump se exibia para um público doméstico e evitou fazer afirmações específicas sobre o sucesso dos ataques de mísseis “inteligentes”. Em suma, foi um espetáculo teatral.

O equilíbrio militar na Síria agora entra em jogo. Para o regime sírio, esse foi o batismo de fogo. Até recentemente, os sírios tinham abatido um jato israelense. Agora eles contabilizam 70% de acerto.

Os sírios estão equipados com sistemas de defesa aérea da era soviética, desenvolvidos nos anos 60. E se os russos atualizarem os sistemas? É exatamente isso o que o chefe do departamento geral de operações do Estado-Maior da Rússia, coronel-general Sergei Rudskoi, insinuou em Moscou no sábado:

“Há alguns anos, levando em conta o pedido urgente de alguns de nossos parceiros, desistimos dos suprimentos de sistemas de mísseis S-300 para a Síria. Diante dos últimos acontecimentos, consideramos voltar a discutir essa questão, não apenas em relação à Síria, mas também a outros países.”

Sem dúvida, será uma mudança se a Rússia equipar o Exército sírio com poder de dissuasão para infligir custos exorbitantes a potenciais agressores. O Irã mostrou como esse tipo de estratégia pode funcionar na vez em que ajudou o Hezbollah no Líbano a adquirir poder de dissuasão contra Israel.

De fato, o Jerusalem Post destacou a observação do general russo. O jornal disse que, se Moscou cumprir a ameaça, “a superioridade aérea de Israel corre o risco de ser desafiada em uma de suas arenas mais difíceis … E poderá ser apenas uma questão de tempo até que um piloto israelense seja morto”.

As defesas antiaéreas sírias são, na sua maioria, sistemas da era soviética, compostos de SA-2, SA-5 e SA-6, bem como de mísseis táticos de superfície-ar mais sofisticados, como os sistemas SA-17 e SA-22. O sistema mais atualizado que Moscou forneceu ao regime sírio é o Pantsir S-1, de curto alcance, que abateu os drones e mísseis que sobrevoaram a Síria.

O avançado S-300 seria uma grande atualização para as defesas aéreas sírias e representaria uma ameaça para os jatos israelenses, já que o sistema de defesa antimíssil de longo alcance pode rastrear objetos como mísseis balísticos e aeronaves em um raio de 300 quilômetros.

O radar com capacidade de engajamento do sistema, que pode guiar até 12 mísseis simultaneamente, ajuda a orientá-los na direção do alvo. Com dois mísseis por alvo, cada veículo lançador pode mirar até seis alvos ao mesmo tempo.

O coronel-general Rudskoi escolheu as palavras cuidadosamente, insinuando que a Rússia também poderia abastecer outros países além da Síria – por exemplo, Venezuela, Coreia do Norte, Líbano, Iraque, etc. O comentário parte do importante pronunciamento do presidente Vladimir Putin, no sábado, sobre o ataque dos Estados Unidos à Síria. Ele disse, “inter alia”: “A atual escalada em torno da Síria é destrutiva para todo o sistema de relações internacionais. A história vai consertar as coisas …

A impetuosidade de Trump em atacar a Síria desafia o sistema internacional e pode abrir uma caixa de Pandora. Ironicamente, Israel, como “Estado na linha de frente”, corre grande risco se o entendimento tácito entre os Estados Unidos e a Rússia desmoronar. Moscou colaborou com o governo de Barack Obama e com Israel ao postergar o fornecimento de mísseis S-300 para o Irã. Igualmente, a Turquia terá que pensar duas vezes antes de se aventurar em se apropriar de mais terras na Síria, caso Damasco recupere o controle de seu espaço aéreo.

O instituto israelense, The Institute for National Security Studies, preparou um documento muito informativo, em 2013, intitulado Síria, Rússia e S-300: formação militar e técnica. Leia aqui.

 

Tradução por Solange Reis
* Artigo originalmente publicado em 17/04/2018, em http://blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/2018/04/15/trump-opens-a-pandoras-box-in-middle-east/

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