Polêmico, ultraconservador Steve Bannon deixou governo Trump em agosto

por Tatiana Teixeira

Em meio à incerteza político-institucional decorrente das sucessivas mudanças no gabinete de Donald Trump e após os violentos protestos de grupos de ódio em Charlottesville em agosto, a demissão do estrategista ultraconservador Steve Bannon ganhou ainda mais relevo. Muito próximo ao presidente, Bannon deixou o cargo no dia 18 de agosto e reassumiu seu posto de presidente-executivo do site de extrema-direita Breitbart News. Aparentemente, ele teria saído por pressão do chefe de gabinete da Presidência, general John Kelly, que estaria tentando colocar alguma ordem e impor controle a um Executivo ainda desajustado e dissonante após quase oito meses de existência.

Os generais da Casa Branca

Kelly e outros três generais fazem parte do que republicanos e comentaristas vêm chamando de “os adultos da equipe Trump”, apontados como os únicos capazes de disciplinar o magnata nova-iorquino. Embora civil, o secretário de Estado, Rex Tillerson, é considerado desse grupo, que também estaria funcionando como um contrapeso à abordagem populista-nacionalista liderada por Bannon na Casa Branca. Os outros nomes desse proeminente eixo militar são o secretário da Defesa, James Mattis, um general aposentado do Corpo de Fuzileiros Navais; o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, general Joseph Dunford, outro marine; e o conselheiro de Segurança Nacional, tenente-general H.R. McMaster, do Exército.

Desde a Guerra Fria não se via uma configuração desse tipo no alto escalão do Executivo nos EUA. Sintoma e consequência de um acontecimento pontual (o governo Trump), também é um fenômeno para se acompanhar de perto por seus impactos em políticas com efeitos de médio a longo prazo para os EUA e, eventualmente, para o mundo.

Contra os excessos liberais

No contexto atual, Bannon talvez seja mais valioso fora do que dentro do governo. Sem os constrangimentos institucionais e do politicamente correto, seria um reforço de peso na guerra da informação e de imagem que vem sendo travada por Trump na imprensa e na política. Função que Bannon e o Breitbart News já haviam exercido além do limite durante a última corrida presidencial, com a divulgação de notícias falsas sobre os rivais do candidato republicano, textos incendiários, ataques ao então presidente Barack Obama e mesmo a (neo, paleo e social) conservadores notórios, em meio às acusações de propagação da ideologia da supremacia branca e de defesa de racismo, xenofobia, misoginia, antissemitismo, homofobia e ultranacionalismo feitas ao material produzido e publicado pelo site.

Ex-conselheiro da musa do Tea Party Sarah Palin e autointitulado “a Leni Riefenstahl desse grupo”, Bannon se tornou presidente-executivo da página em 2012, após a morte de seu fundador, Andrew Breitbart. Desde então, contribuiu para radicalizar seu perfil e, na mesma proporção, aumentar sua visibilidade. Em geral, denuncia a crise do capitalismo e rejeita os valores multiculturais e a agenda pró-minorias que impregnaram a sociedade americana, tornando-a porosa a todo tipo de política progressista e pluralista. Apesar de hoje negar, em julho de 2016, declarou que o site era uma plataforma para a alt-right. Um mês depois, foi convidado por Trump para ser seu diretor de campanha.

Fogo amigo

O problema para a Casa Branca é que Steve Bannon pode funcionar, também e sobretudo, como fogo amigo. Pessoas ligadas a esse ex-veterano da Marinha e investment banker do Goldman Sachs afirmam que ele não hesitará em atacar o governo, denunciando sua fraqueza em adotar de forma inequívoca a agenda America First que o levou à vitória nas urnas, assim como o que vê como excessos globalistas e liberais da equipe de Trump (com todo cuidado e atenção à elasticidade na apropriação desse conceito por parte dos atuais representantes da extrema-direita americana).

Há rumores de que Bannon tenha sido responsável pela recente onda de vazamentos à imprensa (ou por parte dela, pelo menos), expondo seus desafetos e quem quer que fosse contrário à sua agenda econômica nacionalista e protecionista. Entre eles, estão o cunhado e conselheiro especial de Trump, Jared Kushner; o diretor do Conselho Econômico Nacional, Gary Cohn; e o general H. R. McMaster. Este último tem sido alvo constante de ataques de Bannon e do Breitbart, sobretudo, por demitir aliados do agora ex-assessor estratégico.

Plataforma ultraconservadora

Depois de impressionar Trump na disputa eleitoral de 2016, ele assume o cargo de estrategista-chefe do presidente – um dos postos de mais alto perfil na Casa Branca e de funções tão imprecisas quanto amplas. Sua entrada no governo levantou críticas e suspeitas dos adversários democratas e dos correligionários mais moderados de Trump – o establishment conservador igualmente atacado por Bannon. As políticas mais controversas anunciadas até agora em D.C. têm sua digital, junto com a do conselheiro da Presidência Stephen Miller.

Bannon está na origem de propostas e medidas como a primeira versão do decreto antimigração (e antimuçulmanos) – aquela que sofreu uma enxurrada de recursos judiciais e levou os aeroportos americanos ao caos –, a construção de um muro na fronteira com o México, a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris sobre mudança climática (sua maior vitória), assim como do Acordo de Livre-Comércio da América do Norte (Nafta, na sigla em inglês), a imposição de tarifas e/ou cotas à importação de aço, maior pressão sobre a China na área comercial, ou ainda, a ideia de privatizar e terceirizar a guerra no Afeganistão, substituindo soldados americanos por mercenários. Sobre a Coreia do Norte, pronunciou-se contra uma solução militar, eventualmente cogitada pelo presidente Donald Trump.

Segundo Nicholas Burns – ex-subsecretário de Estado para Assuntos Políticos e hoje diretor do projeto Future of Diplomacy, da Kennedy School of Government da Universidade de Harvard –, também seria parte do repertório de Bannon e de seu grupo esvaziar o Departamento de Estado e a diplomacia, priorizando o Departamento de Segurança Interna para assuntos que transitam entre o doméstico e o internacional. O objetivo: endurecer e securitizar a abordagem no que diz respeito a questões como migração e refugiados. Um dos caminhos para isso passa pelo drástico corte no orçamento da pasta, assim como no da Agência Americana para Desenvolvimento Internacional (USAid, na sigla em inglês).

As direitas da Casa Branca de Trump

Como em qualquer gabinete, há de se administrar diferentes tendências partidárias e/ou ideológicas, ou não se governa. No caso de Trump, acompanha-se, desde o início de seu mandato, um embate entre uma ala de direita radical, tendo em Bannon e Miller seus nomes de frente, e a ala ligada ao Partido Republicano e aos conservadores mais tradicionais, como o ex-chefe de gabinete Reince Priebus e o ex-porta-voz da Presidência Sean Spicer, com o círculo familiar e de confiança do magnata nova-iorquino no meio disso. Centralizador, desconfiado e arrogante, o empresário Trump ouve poucos e não escolhe nenhum dos lados – salvo o seu, manifesto pelo pragmatismo, pelo oportunismo e por uma visão rasa, de curto-prazo e imediatista dos acontecimentos.

 

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