Trump ordena ao Pentágono considerar reduzir as forças americanas na Coreia do Sul

por Mark Landler
Traduzido do The New York Times*

Washington – O presidente Trump mandou que o Pentágono prepare opções para reduzir as tropas americanas na Coreia do Sul, poucas semanas antes de realizar um encontro histórico com o líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, de acordo com várias pessoas informadas sobre as deliberações.

Níveis reduzidos de tropas não deverão ser moeda de barganha nas conversas de Trump com Kim sobre o programa nuclear, disseram esses funcionários do governo. Mas eles reconheceram que um tratado de paz entre as duas Coreias poderia diminuir a necessidade dos 28.500 soldados atualmente estacionados na península.

Trump está determinado a retirar tropas da Coreia do Sul, argumentando que os Estados Unidos não são adequadamente compensados pelo custo de mantê-las, que as tropas estão protegendo principalmente o Japão e que décadas de presença militar americana não impediram que a Coreia do Norte se tornasse uma ameaça nuclear.

Seu último esforço coincide com as negociações tensas junto à Coreia do Sul sobre como compartilhar o custo da força militar. Segundo um acordo que termina no final de 2018, a Coreia do Sul paga cerca da metade do custo da manutenção dos soldados – mais de US$ 800 milhões por ano. O governo Trump vem exigindo que ela pague praticamente todo o custo da presença militar.

A diretriz inquietou autoridades do Pentágono e de outras agências, que temem que qualquer redução possa enfraquecer a aliança americana com a Coreia do Sul e aumentar os temores no Japão, no exato momento em que os Estados Unidos embarcam numa negociação nuclear arriscada com a Coreia do Norte.

Funcionários do governo não quiseram dizer se Trump queria opções para redução total ou parcial das tropas, embora a primeira alternativa seja pouco provável. Eles enfatizaram que era mais do que hora de repensar o tamanho e a configuração da força americana, independentemente do florescimento repentino da diplomacia com a Coreia do Norte.

Mas a reunião de Trump com Kim injeta um novo elemento imprevisível. Seu entusiasmo pelo encontro – e a perspectiva de acabar com um conflito militar de quase 70 anos entre as duas Coreias – levou à preocupação de que ele ofereça reduzir as tropas em troca de concessões por parte de Kim.

Na última sexta-feira, o secretário de Defesa, Jim Mattis, acrescentou um ponto a essas preocupações, quando sugeriu que o futuro da presença militar americana pudesse estar na mesa.

“Isso é parte das questões que discutiremos, primeiro nas negociações com nossos aliados e, é claro, com a Coreia do Norte”, disse. “Por enquanto, só temos que continuar com o processo, realizar as negociações e não tentar fazer pré-condições ou presunções sobre como isso vai acontecer.”

Um porta-voz do Estado-Maior das Forças Armadas, coronel Patrick Ryder, disse não ter informações sobre as opções sendo preparadas para o presidente.

Para Trump, a retirada das tropas teria múltiplos benefícios, disse Victor D. Cha, acadêmico sul-coreano da Universidade de Georgetown, que por um tempo chegou a ser considerado para o cargo de embaixador em Seul. Isso teria apelo em sua base política, pouparia o dinheiro dos Estados Unidos e lhe daria crédito na negociação com Kim.

“Mas, do ponto de vista da aliança Estados Unidos-Coreia do Sul, representaria perda de importância”, disse Cha.

Kelly E. Magsamen, alta autoridade do Pentágono em política para a Ásia no governo Obama, disse que “a presença americana na Coreia do Sul é uma parte sacrossanta de nossa aliança”.

O governo sul-coreano reiterou nesta semana que as tropas ainda são necessárias e que elas não seriam retiradas como resultado de um tratado de paz com a Coreia do Norte. Mas mesmo aliados próximos ao presidente Moon Jae-in levantaram dúvidas sobre a justificativa para uma presença americana de longo prazo.

“O que acontecerá às forças dos Estados Unidos na Coreia do Sul se um tratado de paz for assinado?”, disse Moon Chung-in, assessor do presidente, num artigo publicado nesta semana e amplamente lido. “Será difícil justificar a presença contínua delas”.

Recentemente, Kim declarou, por meio de autoridades sul-coreanas, que largaria a velha insistência para que as tropas americanas saiam da península. Alguns especialistas argumentam que ver os soldados americanos partir é muito menos importante para ele do que conseguir o alívio das sanções econômicas.

Durante anos, a presença americana foi mais importante como símbolo de dissuasão do que como força de combate. Nos níveis atuais, o número das tropas caiu cerca de um terço em relação aos anos 90.

Como os sul-coreanos se tornaram uma força de combate de primeira linha – com equipes de operações especiais, capacidade de se opor à artilharia da Coreia do Norte ao longo da Zona Desmilitarizada e, agora, com forças cibernéticas próprias – eles se tornaram menos dependentes dos Estados Unidos. A maioria das tropas americanas recuou para o sul de Seul.

Desde que o presidente George Bush retirou as armas nucleares táticas da Coreia do Sul, no início dos anos 90, a dissuasão nuclear contra o norte tem se mantido distante em silos de mísseis no território continental dos Estados Unidos, submarinos no Pacífico ou bombardeiros baseados em Guam.

Trump não é o primeiro presidente a pressionar pela redução de tropas. Jimmy Carter concorreu com a promessa de retirar todas as forças de combate terrestres, em parte para protestar contra o governo autocrático da Coreia do Sul na época. A resistência dos militares e do Congresso frustrou seus esforços. Em 2004, o secretário de Defesa de George W. Bush, Donald H. Rumsfeld, transferiu quase 10 mil soldados da Coreia do Sul para a guerra do Iraque.

Ex-autoridades disseram que, durante o governo Obama, o Pentágono sempre relutou em considerar a redução de tropas ou a suspensão de exercícios militares conjuntos quando a Casa Branca falava sobre possíveis caminhos livrar a Coreia do Norte das armas nucleares.

“Seria tolice entregar tudo isso no início das discussões, dado o longo histórico norte-coreano de quebra de acordos”, disse Christine Wormuth, alta ex-funcionária do Departamento de Defesa no governo Obama.

Trump, no entanto, argumenta que há muito tempo a presença militar dos Estados Unidos não é um ativo, mas um passivo – não apenas na Coreia do Sul, mas também no Japão. Ele disse que, como ambos os países ficaram ricos, deveriam ter assumido mais o fardo de sua defesa. Durante a campanha presidencial de 2016, ele chegou a sugerir que as duas nações adquirissem suas próprias armas nucleares para que não precisassem depender do guarda-chuva nuclear americano.

De má vontade, Trump admitiu que as tropas mantiveram a paz na península. Mas disse que elas não impediram o Norte de adquirir armas nucleares ou ameaçar seus vizinhos.

“Nossos soldados ficam lá sentados, vendo mísseis subir”, disse ele em entrevista ao The New York Times, em julho de 2016. “Você se pergunta: o que estamos ganhando com isso?”.

Autoridades disseram que, ao longo do ano passado, Trump continuou a questionar sobre a necessidade de tropas para seus assessores, como seu ex-conselheiro de segurança nacional, o tenente-general H. R. McMaster, e o vice deste, general Ricky L. Waddell.

Antes das Olimpíadas de Inverno em Pyeongchang, quando as tensões entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte estavam altas, o presidente mencionou a ideia de retirar os familiares dos soldados por razões de segurança. Um ex-funcionário disse que o chefe de gabinete de Trump, John F. Kelly, o convenceu a desistir porque o plano alimentaria os temores de um ataque militar iminente contra o norte.

Durante aquele período, as tensões se agravaram entre a Casa Branca e o Pentágono porque os assessores de Trump acreditavam que os militares protelavam em dar ao presidente as opções para um ataque limitado à Coreia do Norte.

Os funcionários dizem que a situação se inverteu agora: o Pentágono teme que Trump pressione muito rapidamente pela desmilitarização.

 

Tradução por Solange Reis
Artigo originalmente publicado em 03/05/2018, em https://www.nytimes.com/2018/05/03/world/asia/trump-troops-south-korea.html

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