Ingerência externa: exceção ou regra?

Prédio do FBI, em Washington, D.C. (Crédito: Ben C.K./Flickr)
Terceiro da série Relações BR-EUA em matéria de Segurança Pública
Por João Gaspar* [Informe OPEU] [Série] [Segurança pública] [Brasil-EUA]
“Não se iludam quanto aos Estados Unidos. O que importa são os seus interesses. (…) Os governantes americanos fazem o que lhes interessa, e viemos aqui para cuidar dos nossos interesses. Ponto final. O resto é retórica”.
– Carlos Costa, ex-chefe do FBI no Brasil, para Bob Fernandes
(Carta Capital, ed. 283, 2004)
Nos Informes anteriores desta série OPEU, vimos quais as determinantes materiais por trás da “cooperação policial” entre Brasil e EUA e como, historicamente, vem-se dando este seu relacionamento, nos marcos do imperialismo exercido pelos estadunidenses sobre a América Latina. Tivemos já a oportunidade, nesse sentido, de caracterizar estas relações em matéria de Segurança Pública como desiguais, de um lado, e violentas, de outro, chamando a atenção do leitor para o fato de que, constituindo tal adjetivação a essência do fenômeno, residirá aí o seu único aspecto perene, resistente mesmo ao processo de informalização e pessoalização que se inicia no imediato pós-Guerra Fria.
Acreditamos, porém, que não logramos ilustrar empiricamente como tal estrutura – mais facilmente discernível tendo-se à vista, do lado brasileiro, as ditaduras do Estado Novo e de 1964, do que o regime liberal atualmente vigente – mantém-se ainda hoje em voga, de modo que buscaremos fazê-lo com o presente artigo. Como mostraremos, a “cooperação” com os gringos está longe de ser técnica ou inofensiva: é política e indissociável, assim, do poder.
Consulte os Informes “Segurança Pública na Dependência” e “A cooperação policial entre Brasil e EUA no marco do Imperialismo”, ambos desta série, e “Atuação da USAID em matéria de Segurança Pública no Brasil (1950 – 1970)”, para ficar em dia com o estudo que estamos fazendo, junto do OPEU, acerca das relações Brasil-EUA em matéria de Segurança Pública.
O “pintar e bordar” das agências dos EUA no Brasil
Em suas oito matérias de capa na revista Carta Capital (CC), publicadas entre março de 1999 e abril de 2004, o jornalista Bob Fernandes expôs, a partir da Polícia Federal (PF), a materialidade dos treinamentos e das remessas de equipamentos e dinheiro oferecidos às corporações policiais brasileiras pelos EUA.
Bob mostrou como, de tijolos a camionetes, passando por “bonificações” aos servidores, tudo relativo ao Centro de Dados Operacionais (CDO) da PF – futuramente SOIP, COIE e, então, Divisão Antiterrorismo (DAT) – foi levado a cabo com investimento da CIA (Agência Central de Inteligência), e de que modo, funcionando em “regime de informação compartilhada”, o CDO tornou-se, basicamente, uma joint-venture CIA/PF.
Os federais que fossem trabalhar no Centro tinham de passar por treinamento especializado (com instrutores dos EUA) e, pasmem, submeter-se ao teste do polígrafo (detector de mentiras utilizado pelos estadunidenses no âmbito do seu protocolo Reid). Em dado momento, para “baixar a poeira”, o teste passou a ser aplicado em hotéis nos EUA. Note-se que os nossos oficiais viajavam ao exterior, valendo-se de uma mentira contada ao Estado brasileiro com o selo da Embaixada, segundo a qual estavam indo atender a algum seminário internacional em narcotráfico, terrorismo etc. Ao final de cada mês, conforme revelou a CC em sua ed. 98, o policial do CDO “tinha acrescido ao seu salário, por fora, um adjutoriozinho. Coisa pouca: US$ 200. Duzentinho. Tudo bem: dóla é dóla”.
As mudanças de nome explicam-se, enquanto tentativa de dissimular os laços da PF com os EUA: o pessoal do CDO foi quem grampeou o Palácio do Planalto quando do escândalo em torno ao Sistema de Vigilância da Amazônia (Sivam), no governo Fernando Henrique Cardoso. Disputavam a licitação do projeto de US$ 1,4 bilhão, então, as empresas Raytheon, estadunidense, e Thompson, francesa, havendo a primeira, não por acaso, levado a bolada.
Como Bob Fernandes perspicazmente relata, ainda na ed. 98:
O Estado brasileiro aceita que a CIA pague a construção de uma instalação da Polícia Federal, doe os automóveis e ainda entregue um adjutório a policiais amarelos no final do mês. Ainda que, eventualmente, a rapaziada grampeie o presidente da República.
(Arquivo) As oito capas de Bob Fernandes para a Carta Capital (Crédito: GGN)
O caráter informal que assume o relacionamento entre Brasil e EUA em matéria de Segurança Pública a partir do fim da Guerra Fria, indicado por nós anteriormente, aparece aqui de forma bastante clara. Tomemos, por exemplo, o caso da CDO, em que agentes brasileiros – sobrepagos por fora – e estadunidenses mentiam, juntos, ao Estado brasileiro (há algo mais extraoficial que isso?). Ou, ainda, consideremos a resistência que os servidores da Embaixada dos EUA, pertencentes originalmente ao FBI, à CIA, à DEA (polícia federal contra-narcóticos daquele país) etc., expressavam ao serem chamados a se submeterem à Secretaria Nacional Antidrogas (Senad) do Ministério da Justiça e a se conformarem ao arcabouço jurídico-institucional brasileiro, em vez de tratarem diretamente com os nossos federais no tocante a operações de repressão ao tráfico de drogas.
É isso. James Derham (que já dizia: “temos o dinheiro, as regras são as nossas”), encarregado de negócios da Embaixada, retornou aos EUA por, em um encontro casual, haver perdido a compostura junto do chefe da Senad, Walter Maierovitch. Como se pode ver, a informalidade é algo que cala fundo nos estadunidenses, por ser uma estratégia fundamental à persecução dos seus interesses.
Pois bem. Diversas agências policiais federais dos EUA, para além mesmo das já citadas neste Informe, tiveram (e ainda têm) um passe-livre para atuarem em território brasileiro. Este vem a ser obtido, precisamente, pela sua abordagem informal junto dos nossos oficiais, os quais, envoltos, por sua vez, em uma realidade de dependência, que lhes dificulta a vida e o trabalho, e faz-lhes maiores as necessidades materiais, a priori mostram-se já dispostos a “cooperar” – depois de “quebrado o gelo” com palestras, cursos etc., então, nem se fala –, ainda que isso signifique se submeter. Eis a estrutura imperialista a se delinear, conforme já analisamos outrora. A dependência pesa.
Este passe-livre que os estadunidenses obtêm leva-os a ferir tanto a soberania brasileira, por óbvio, quanto a própria legislação dos EUA, segundo a qual a ação extraterritorial do seu governo federal se resume ao abrangente mandato da CIA. Senão, vejamos: por aqui, policiais estadunidenses (disfarçados de attachés, adidos, conselheiros etc., na Embaixada) contratam locais (dentre o povo ou mesmo dentre nossos oficiais) para lhes servirem de agentes ou simples informantes – com pagamento de salários, despesas operacionais, bonificações/comissões por carga de droga apreendida ou “criminoso” encontrado, adjutórios etc. –, conduzindo eles próprios operações policiais. Além disso, custeiam – até onde sabemos, pelo menos a DEA o fez – operações da PF que lhes interessam e/ou que digam respeito a investigações conduzidas por si, via transferência bancária (o Citibank era muito utilizado), vejamos só, para contas pessoais de agentes e delegados envolvidos. Dentro da Embaixada, para tanto, trabalhavam até doleiros.
(Arquivo) Selos da comunidade de Inteligência dos EUA, coordenada pelo Escritório do Diretor da Inteligência Nacional (emblema ao centro) (Crédito: WMP)
Toda essa atuação alheia a canais oficiais faz com que os estadunidenses logrem se projetar em nossa política doméstica, empregando todo o seu poder e toda a sua potência, derivados de suas capacidades materiais. Assim, buscam definir as agendas de nossas instituições e pagar para que as mesmas sejam implementadas, com nossa ação ou omissão em seu favor.
O resultado? – Nossos oficiais prestando contas aos estrangeiros e repassando-lhes, em primeira mão, informações obtidas no curso de suas atividades, em detrimento do comando das suas próprias corporações.
Como se pode imaginar, há um enorme problema nesse forma de se proceder, afinal, “Não é prudente repassar aos americanos todos os detalhes de nossas investigações. Principalmente, porque nesses casos trata-se de uma via de mão única, as informações fluem só para lá”, conforme explica o ex-delegado da PF Rômulo Menezes (apud CC, ed. 287, 2004).
E não é necessário, atente-se a isso, o pagamento de facto, afinal, a modalidade consensual de dominação imperialista é plástica. Cursos, treinamentos, palestras, workshops e variedades desse tipo – ofertadas pelas agências estadunidenses às nossas policiais – funcionam igualmente bem, inclusive servindo a interesses individuais de progressão na carreira, por exemplo.
Conforme comenta Carlos Costa, ex-chefe do FBI no Brasil, em entrevista à CC publicada em sua ed. 283, de 2004:
Uma instituição mal remunerada, como a Polícia Federal, que não tem dinheiro para pagar a conta do telefone, não vai aceitar uma doação? Isso é absolutamente ridículo. O Brasil carece de investir no treinamento e no pagamento. Como diz o velho ditado americano, não existe almoço grátis. No FBI, como qualquer outra instituição americana, nós não podemos aceitar um centavo de ninguém. A minha diferença aqui é que eu, como chefe do FBI, não dava dinheiro ao Brasil, não comprava o Brasil. Dava assistência técnica, treinos, treinava os vossos policiais…
– CC: Mas treinar já é “influenciar”, você já está a se infiltrar…
Ah, sim, mas isso é natural. Nós treinamos colegas brasileiros em técnicas de investigação, a pedido de vocês. (…)
Com o FBI e o Corpo de Segurança da Embaixada dos EUA (RSO, na sigla em inglês), a própria Polícia Civil de Santa Catarina (PCSC) já realizou, em sua Academia de Polícia (Acadepol), diversas parcerias para a capacitação dos nossos efetivos na atividade de persecução penal e Inteligência. Entre 7 e 11 de março de 2016, por exemplo, foi ministrado, por agentes do FBI, o curso “Interview and Interrogation”, cujo programa foi o seguinte¹:
DIA |
EMENTA |
Carga Horária |
7 de março – 2ª-feira |
Apresentações Estrutura Policial Brasil/EUA Escuta Ativa Exercícios práticos |
8 h/a |
8 de março – 3ª-feira |
Estrutura da Entrevista Técnica de Entrevista Cognitiva Exercícios práticos |
8 h/a |
9 de março – 4ª-feira |
Detecção de Mentiras Exercícios práticos |
8 h/a |
10 de março – 5ª-feira |
Elementos do Interrogatório Instruções e exercícios |
8 h/a |
11 de março – 6ª-feira |
Interrogatório Exercícios práticos Considerações finais Avaliações e entrega de certificados |
4 h/a |
C. H. Total |
36 h/a |
(Arquivo) Programa do curso do FBI na Acadepol/PCSC (Crédito: elaboração própria, a partir do certificado entregue aos concluintes)
O curso em questão, anote-se, parece que veio a ser pouco útil às nossas forças, por se basear no protocolo Reid de interrogatório (em que quase se produz, inquisitorialmente, a confissão, empregando-se aí, inclusive, o famigerado polígrafo), oposto àquele adotado hoje em dia pela PCSC, que é o PEACE.
Não obstante, tal ação, em conjunto com as palestras e treinamentos em geral que costumam acontecer na Acadepol – por exemplo, em dezembro de 2024, deu-se, sob instrução do RSO/Consulado-Geral dos EUA em Porto Alegre, uma espécie de minicurso sobre cooperação internacional em Segurança Pública, fraudes em passaportes e vistos e técnicas de identificação de impostores –, serve sobremaneira para que os estadunidenses “quebrem o gelo” junto dos nossos dirigentes e, destarte, logrem influenciá-los, para além da mera doutrinação. Num futuro, será eventualmente, assim, mais fácil de se obter informações, por exemplo, ou de se influenciar procedimentos e processos, em benefício de cidadãos e negócios dos EUA.
Novamente, faz-se importante retomar a entrevista de Carlos Costa a Bob Fernandes em 2004:
… nós não deveríamos ter, como tivemos e temos, contato direto com as policiais civis, militares. Só deveríamos nos mover com monitoramento da Polícia Federal, e todos se movem aqui como querem. Falamos direto com as polícias, temos relações diretas com, por exemplo, municípios ou polícias civis ou militares. (…)
CC – Direto com governadores, secretários de Estado, chefes de polícia, comandantes da PM, soldados…
Com todos. Se eu faço e ninguém reclama, continuo a fazer porque está a me servir. Eu tinha mais sucesso nas relações com as polícias estaduais do que, por exemplo, com a Polícia Federal, que está muito isolada, às vezes, da realidade da rua, dos acontecimentos.
… A própria “segurança da embaixada”, RSO, que também é uma polícia entre eles, tem influência para obter informações (…) sobre dados de cidadãos brasileiros.
Com tudo isso em mente, podemos compreender melhor o que a professora Priscila Villela explica (p. 13-14, tradução nossa):
… os EUA conduzem conferências, eventos e treinamentos para promover transferência de conhecimento, assim como para construir centros de relacionamento íntimos e de confiança entre law enforcement agencies em ambos os países. Há um esforço deliberado por criar relações de confiança entre autoridades estadunidenses e brasileiras pela construção de um canal direto para a polícia, de modo que eles [os estadunidenses] possam influenciar o trabalho da polícia, investigações, a formulação de leis e políticas públicas para construir uma ordem social que favoreça sua posição hegemônica. Em grande medida, portas foram mantidas abertas como meios para influência e para garantir um ambiente seguro e favorável para negócios internacionais.
Corroborando, enfim, nossa tese de que é perene o caráter desigual e violento da “cooperação” entre Brasil e EUA em matéria de Segurança Pública, ainda que o nível de informalidade de tal relacionamento venha num crescente, Carlos Costa diz para Bob Fernandes, em entrevista de 2020:
Confirmo.17 anos depois está a acontecer tudo o que eu disse. (…) Assuntos que aconteceram com a Dilma e continuam (…). O perfil dos acontecimentos não muda. Então, a história se repete em círculo, em círculo; então, quando se vê certas coisas é a repetição, só mais sofisticado, ou mais (…) cordial, mas é aquela história: o bom espião esconde-se à frente de todo mundo e ninguém sabe que ele está a tirar vantagem.
Uma “cooperação” interessada

(Arquivo) Capa do livro do prof. dr. Arthur Banzatto acerca da Operação Lava Jato (Crédito: Kotter Editorial)
Acreditamos que até aqui, com este e os demais Informes desta série OPEU, logramos identificar conceitualmente e ilustrar empiricamente os interesses que tantos os nossos dirigentes quanto aqueles estadunidenses – cada qual informado pela sua burguesia nacional e buscando também ganhos particulares – veem como possíveis de lograrem por meio de uma “cooperação” em matéria de Segurança Pública. Como demonstração definitiva do que viemos expondo, todavia, tomemos ainda o caso da Operação Lava Jato, a partir do trabalho do prof. dr. Arthur Banzatto (UFGD), sintetizado no seu Informe OPEU “Lava Jato e a atuação dos Estados Unidos”, publicado em coautoria com a profª dra. Camila F. Vidal.
Toda a influência e o papel ativo que os EUA tiveram no avanço da Operação Lava Jato, nesse sentido – os quais foram materialmente desvelados pelos pesquisadores citados –, remontam a laços que funcionários públicos federais do sistema de justiça criminal brasileiro mantinham desde há muito tempo com suas contrapartes estadunidenses, no âmbito do imperialismo exercido pelos EUA sobre a América Latina.
A estrutura que já delineamos outrora se encontra, pois, também aqui, na medida em que: 1) de um lado, alguns dos nossos juízes, promotores e policiais federais “cooperavam” com oficiais dos EUA, visando à concretização de seus desejos (“mostrar trabalho” para ganhar prestígio e ascender na carreira ou na política partidária; melhorar os currículos; ter mais recursos para trabalhar etc.) e daqueles de segmentos da burguesia nacional, aos quais servem; e 2) de outro, os EUA “cooperavam” conosco, visando à nossa doutrinação e cooptação; à definição de nossas agendas; à infiltração em nosso meio para a obtenção de informações sensíveis; à deposição de regimes contrários aos seus interesses; e, enfim, ao aumento da parcela dos mercados brasileiros relativa às suas empresas, para lucrarem maiormente.
Insere-se aí o esforço da Embaixada estadunidense (“Projeto Pontes”, de 2008) por capacitar nossos operadores da justiça criminal no uso dos novos institutos processuais penais surgidos a partir de 2007 – muito por pressão exercida pelos próprios EUA sobre nós para que “modernizássemos” nossa legislação para uma mais efetiva persecução dos ditos “crimes do colarinho branco” –, tais como delação premiada (derivado do plea bargaining existente nos EUA) e forças-tarefas. Além, claro, do íntimo relacionamento mantido pelas autoridades da Lava Jato e do Departamento de Justiça dos EUA, os quais costumavam interagir de modo extraoficial, isto é, informal, compartilhando, entre si, documentos que fossem úteis às investigações de cada qual sobre grandes empresas brasileiras. Não fosse, afinal, o apoio da força-tarefa de Curitiba, dificilmente as multas multimilionárias impostas à Odebrecht e à Petrobras, com base na Lei de Práticas de Corrupção no Exterior dos EUA, seriam levadas a cabo.
Quanto aos interesses dos estadunidenses, considere-se o exposto por Arthur Banzatto e Camila F. Vidal em seu texto:
A intervenção de instituições e agentes públicos estadunidenses na Operação Lava Jato pode ser explicada com base em interesses concretos, dentre os quais podemos destacar: a aceleração dos leilões do pré-sal brasileiro (Haidar, 2017) e a venda de ativos da Petrobras (Nogueira e Slattery, 2020), em favor dos interesses das grandes empresas petroleiras transnacionais, como British Petroleum (BP), British Shell, Chevron, Cnooc, ExxonMobil, QPI e Statoil; assim como o recuo da presença das empresas brasileiras de construção civil (Odebrecht, OAS, Camargo e Correia, entre outras) no exterior, abrindo espaço para empresas estrangeiras concorrentes (Carvalho, 2018).
É bastante explicativo, também, o que trouxe o jornal francês Le Monde em reportagem de 2022 (tradução e grifo nossos):
Diante de vários jornalistas membros do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ), Thomas Shannon, embaixador americano em Brasília de 2010 a 2013, declarou que o projeto político brasileiro de integração econômica da América do Sul suscitava sérias preocupações no Departamento de Estado e que este “considerava o desenvolvimento da Odebrecht como parte do projeto de poder do PT e da esquerda latino-americana”. Preocupações tanto mais fortes quanto o episódio das revelações do delator Edward Snowden, em agosto de 2013, sobre a espionagem da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA) contra Dilma Rousseff e a Petrobras, claramente causou um arrepio entre Brasília e Washington. “Se somarmos a tudo isso uma relação pessoal bastante ruim entre Barack Obama e Lula, e um aparato do PT que ainda desconfia do vizinho norte-americano, podemos dizer que tínhamos trabalho a fazer para corrigir a situação”, reconhece um ex-membro do DoJ [Departamento de Justiça dos EUA] encarregado dos casos latino-americanos.
Para finalizar este Informe: perguntado em 2004 sobre o que aconteceria com policiais estadunidenses que se envolvessem em ações “conjuntas” de caráter operacional, semelhantes às praticadas no Brasil, Carlos Costa foi certeiro:
Nunca aconteceria. Se acontecesse, iriam todos para a prisão, de cima a baixo.
– CC: Cadeia para o secretário de Justiça?
Para todos, inclusive para o diretor do FBI. Por quê? Porque isso é uma violação à soberania.
E acaba com quaisquer dúvidas que tenham ficado:
CC – Então vocês estão aqui para quê?
É para ser claro? Para buscar informações e “influenciar” o anfitrião. (…)
CC – Então essas polícias, entre elas as norte-americanas, estão aqui a fazer o quê?
Toda e qualquer coisa que seja do nosso interesse.
Mais claro impossível.
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Informe “A cooperação policial entre Brasil e EUA no marco do Imperialismo”, em 14 abr. 2025
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Informe “O que significa Marco Rubio como secretário de Estado para a política externa dos EUA?”, em 15 nov. 2024
Informe “O evangelho d’O Sonho Americano, pela Rede Globo”, em 13 nov. 2024
¹ Todas as informações sobre esse curso do FBI foram obtidas em entrevista concedida pelo Diretor da Academia de Polícia da Polícia Civil de Santa Catarina, sr. André Bermudez, na sede da Acadepol, em Florianópolis, no dia 27 nov. 2024, em cujo nome agradecemos à PCSC pela colaboração. A interpretação dos dados colhidos, não obstante, feita a partir dos referenciais teóricos adotados por nós, pesquisadores, é de nossa inteira responsabilidade.
* João Gaspar é graduando em Relações Internacionais pela Universidade Federal de Santa Catarina, bolsista do Instituto de Estudos Latino-Americanos (IELA-UFSC) e colaborador do projeto “O poder das ideias e a manutenção hegemônica através do consenso: Estados Unidos e América Latina”. Contato: joaogkg@hotmail.com.
** Revisão e edição final: Tatiana Teixeira. Recebido em 11 abr. 2025. Este e os próximos Informes desta série derivam de uma pesquisa que vem sendo conduzida no âmbito do projeto “O poder das ideias e a manutenção hegemônica através do consenso: Estados Unidos e América Latina”, sob orientação da professora Dra. Camila Feix Vidal. Este conteúdo não reflete, necessariamente, a opinião do OPEU, ou do INCT-INEU.
*** Sobre o OPEU, ou para contribuir com artigos, entrar em contato com a editora do OPEU, Tatiana Teixeira, no e-mail: tatianat19@hotmail.com. Sobre as nossas newsletters, para atendimento à imprensa, ou outros assuntos, entrar em contato com Tatiana Carlotti, no e-mail: tcarlotti@gmail.com.
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