Os adultos estão saindo da sala

por Carlos Gustavo Poggio Teixeira

Ao tornar-se presidente dos Estados Unidos em 1989, George H. W. Bush já tinha considerável experiência em política externa. Além de ter sido aviador naval durante a Segunda Guerra Mundial, Bush pai foi embaixador nas Nações Unidas durante a administração Nixon, enviado especial à China e diretor da CIA durante a administração Ford, além de presidente do Council of Foreign Relations entre 1977 e 1979, e vice-presidente de Ronald Reagan entre 1981 e 1989. Bush chegou à presidência, portanto, com uma compreensão sofisticada sobre as relações internacionais além de uma robusta rede de contatos no establishment político note-americano. Essas condições permitiram que Bush pai conduzisse uma bem-sucedida guerra com o Iraque em 1991.

O contraste com a presidência de seu filho, George W. Bush, não poderia ser mais evidente. Ao contrário do pai, Bush filho não tinha nenhuma experiência relevante em política externa. Bush teve o cuidado se se cercar de assessores experientes, muitos dos quais haviam trabalhado para o seu pai, como Dick Cheney e Donald Rumsfeld. Entretanto, a pouca experiência do ex-governador texano permitiu que a agenda fosse controlada por um pequeno grupo de assessores sem uma supervisão adequada. O resultado foi uma desastrosa invasão do Iraque em 2003.

A comparação entre Bush pai e Bush filho, 1991 e 2003, podem servir para nos ajudar a avaliar melhor os riscos que envolvem a administração Trump atualmente.  É bem verdade que depois de Bush pai, nenhum dos presidentes que o sucederam – Clinton, Bush filho, Obama e Trump – chegou ao cargo com alguma experiência significativa em política externa. No entanto, o que difere o atual presidente dos anteriores, além do fato de Trump não ter ocupado nenhum cargo público antes da presidência, é sua aparente incapacidade de manter uma equipe de assessores minimamente coesa. Com pouco mais de um ano à frente da presidência, Trump já detém o recorde de presidência com mais mudanças de gabinete a essa altura do mandato. Seu antigo Secretário de Estado, Rex Tillerson, foi o que ocupou o cargo por menos tempo na história recente. John Bolton já é o terceiro Assessor de Segurança Nacional em 14 meses de governo. Possíveis novas demissões continuam a circular na imprensa norte-americana.

Além disso, chama a atenção não apenas a quantidade de demissões, mas a qualidade dos substitutos. Clinton, Bush filho, e Obama mantinham pessoas em suas administrações com perspectivas diferentes das suas próprias. Bill Clinton, por exemplo, teve como Secretário de Defesa em seus últimos anos na presidência, o Republicano William Cohen, assim como Obama, que manteve Robert Gates, oriundo da administração Bush, no Pentágono. Isso, claro, sem falar na escolha de Hillary Clinton como Secretária de Estado em seu primeiro mandato, e no republicano Chuck Hagel, no segundo. Da mesma forma, Bush filho manteve o moderado Colin Powell na Defesa mesmo com o general discordando da visão vigente no gabinete de Bush à época da invasão ao Iraque. Trump, ao contrário, parece se incomodar com assessores que pensam diferente dele. Ao demitir Tillerson ele alegou que “we were not really thinking the same”. Para qualquer um que estudou os encontros do Excomm, o comitê formado pela administração Kennedy para aconselhar o presidente durante a Crise dos Mísseis Cubanos em 1962, a desvalorização da presença de pessoas com pontos de vista diferentes na administração deveria preocupar. “Thinking the same” é algo que deveria ser evitado na escolha dos assessores de política externa de um presidente, dadas as vantagens auferidas da exposição de um líder a diferentes pontos de vista. É inevitável especular qual seria o resultado da crise de 1962, um dos momentos mais tensos da Guerra Fria, caso alguém como Trump fosse presidente.

É dentro desse contexto que as recentes mudanças no gabinete de Donald Trump devem ser examinadas. O quarteto formado pelo Secretário de Defesa, James Mattis, o Chefe de Gabinete John Kelly, e os demitidos H. R. McMaster e Rex Tillerson, que ocupavam, respectivamente, a Assessoria de Segurança Nacional e o Departamento de Estado eram considerados “os adultos na sala”, em uma administração liderada por um presidente que combina um temperamento forte com uma falta de conhecimento sobre as relações internacionais. Dos quatro, McMaster e Tillerson fossem talvez os mais moderados. A troca de Tillerson por Mike Pompeo e, principalmente, de McMaster por John Bolton indicam que Trump tende a buscar um perfil mais agressivo em política externa. Com seguidos rumores sobre a demissão de Kelly, o general Mattis parece ser o único seguro no cargo e, possivelmente, o último intermediário entre os instintos de Trump e uma política externa um pouco mais comedida. Ironicamente, Mattis é conhecido nos círculos militares pelo apelido de “cachorro louco.” Isso nos dá uma dimensão do atual estado da administração Trump.

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