Gorsuch dá início à virada conservadora na Suprema Corte

No dia 23 de março, o Senado completou a sabatina do juiz Neil Gorsuch, nomeado para a Suprema Corte dos Estados Unidos pelo presidente Donald Trump. A vaga está aberta desde fevereiro de 2016, em razão do falecimento do juiz Antonin Scalia. No último ano, a maioria republicana no Senado bloqueou a nomeação do juiz Merrick Garland, indicado pelo então presidente Barack Obama. Agora, os republicanos precisam conquistar votos de, ao menos, oito senadores democratas para aprovar a nomeação de Gorsuch pela maioria qualificada de 60 votos. Caso a oposição democrata seja irredutível, os republicanos podem ainda invocar a chamada “opção nuclear” e alterar as regras de votação no Senado, o que abriria um precedente histórico. A nomeação de Gorsuch para a Suprema Corte é apenas o primeiro de vários postos de juízes que Trump preencherá durante sua presidência, que poderá marcar uma virada conservadora no sistema legal dos Estados Unidos.

A sucessão de Scalia e o equilíbrio da Suprema Corte

Com o falecimento do juiz Antonin Scalia, em fevereiro de 2016, iniciou-se uma disputa pela orientação da Suprema Corte dos Estados Unidos. O então presidente Barack Obama escolheu Merrick Garland, um sucessor que imaginava poder agradar a ambos os partidos e era apoiado por grupo liberais como o Democracy for America. Senadores republicanos, entretanto, bloquearam sua nomeação com o argumento de que um presidente com menos de um ano de mandato não poderia fazer tal escolha. Diante do bloqueio, a Suprema Corte vem operando com apenas oito membros: quatro indicados por presidentes democratas e quatro indicados por presidentes republicanos. Dentre eles, o juiz Anthony M. Kennedy tende a mudar de posição mais frequentemente, sendo por vezes o fiel da balança. Quando o juiz Kennedy vota com os liberais, eles têm maioria, quando vota com os conservadores, ocorre um empate e nenhum precedente é criado. Com a ajuda de Kennedy, os liberais rejeitaram as restrições às clínicas de aborto no Texas e mantiveram os planos de ação afirmativa das universidades.

A escolha de Gorsuch vem preencher o vazio conservador deixado por seu antecessor e é apoiada por grupos como a Heritage Foundation e a Federalist Society. Segundo Trump, essas organizações o ajudaram na escolha de possíveis nomes e, caso ele venha a nomear outros juízes, será desta lista que ele irá escolher. Gorsuch é um originalista: acredita que a Constituição norte-americana deve ser analisada de acordo com a intenção dos Founding Fathers e, dessa forma, acaba por se tornar o preferido dos conservadores. Essa preferência se dá, principalmente porque ele entende que o sistema de regulação estatal vigente concede muito poder ao Estado. Contrário a um precedente de 1984, Gorsuch manifestou que o juiz não está obrigado a seguir o entendimento das agências governamentais sobre leis federais de sua competência.

Pelo lado dos liberais, há preocupação em relação as suas posições sobre direito de reprodução e aborto, eutanásia e direito de gênero. Gorsuch nunca julgou um caso específico sobre aborto, mas em voto dissidente apoiou empresa que se recusou a distribuir contraceptivos exigidos pela Obamacare com base na liberdade religiosa, e escreveu um estudo sobre eutanásia, condenando a prática. Outros casos que serão julgados pelo novo juiz incluem o do direito de transgêneros utilizarem o banheiro correspondente ao sexo com o qual se identificam e um sem número de casos sobre o direito ao aborto que poderão reverter o precedente de Roe v. Wade.

Perspectivas para a Suprema Corte

As perspectivas não são as melhores para o movimento liberal e sua agenda de direitos humanos. Espera-se decisões cada vez mais conservadoras, o que poderá levar à retração de direitos, principalmente no plano das questões de reprodução e de gênero. A escolha de Neil Gorsuch como juiz da Suprema Corte, no curto prazo, fará com que a relação entre conservadores e liberais volte ao status anterior à morte de Scalia. Entretanto, no longo prazo, Trump não nomeará apenas Gorsuch, que tem 49 anos e pode permanecer por muito tempo no cargo, mas também há a possibilidade de que ele venha a indicar outros três juízes.

Ainda que o cargo de juiz da Suprema Corte seja vitalício, os juízes Stephen Breyer e Ruth Ginsburg, nomeados pelo democrata Bill Clinton, e Anthony Kennedy, nomeado por Ronald Reagan, estão próximos da idade em que juízes historicamente se aposentam. Caso Trump possa nomear juízes jovens e de perfil conservador, como Gorsuch, para essas três vagas, a influência de suas ideias e interpretações poderá se estender por muitos anos.

Além disso, a Casa Branca espera nomear entre 70 e 90 juízes para as Cortes de Apelação nos Estados Unidos nos próximos anos. O número é elevado pela idade de alguns juízes e pelas mesmas táticas de obstrução usadas pelos senadores republicanos durante o governo Obama. Ao preencher tais vagas com juízes de perfil conservador, é provável que o impacto no sistema jurídico seja ainda maior do que a nomeação de Gorsuch, já que a maioria dos casos para nas Cortes de Apelação e nunca chega a ser ouvida pela Suprema Corte.

Resta saber se os senadores democratas vão se juntar ao líder da minoria na Casa, Charles Schumer (D-NY), e tentar bloquear a nomeação de Gorsuch através da manobra conhecida como filibuster. Isso obrigaria os republicanos a conquistar pelo menos oito votos democratas. Caso contrário, restariam duas opções: Trump pode retirar a nomeação e indicar outro juiz de posições mais moderadas aos olhos da oposição; ou o líder da maioria, o senador Mitch McConnell, pode invocar a chamada “opção nuclear” e mudar as regras do Senado para aprovar a nomeação por uma maioria simples. Apesar da cautela de McConnell com a escolha, que abriria um precedente histórico e equipararia as decisões do Senado às de maioria simples na Câmara, esse parece ser o caminho preferido de Trump.

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