Orçamento mostrará prioridades de Trump

Manchetes, tweets e polêmicas marcaram as primeiras seis semanas da presidência de Donald Trump. Em meio a controvérsias, algumas iniciativas e mudanças concretas começam a dar substância ao novo governo. Dentre elas, a primeira proposta de orçamento, a ser divulgada em 16 de março, deve trazer uma indicação mais clara de quais políticas o governo realmente levará a sério, e o que são apenas táticas para satisfazer eleitores e manter a mídia e a opinião pública ocupadas. Trump pode criar quantas manchetes quiser nas redes sociais, mas se o governo quiser implementar políticas novas terá que empenhar dinheiro e conseguir aprovação do Congresso.

Aumento de gasto militar

Até agora, o que se sabe é que a proposta de orçamento deve trazer um aumento no gasto militar e uma diminuição equivalente nas despesas não militares do governo. Um crescimento de US$ 54 bilhões levaria o orçamento militar para US$ 603 bilhões. Trump tem alardeado que este será o maior aumento de gasto militar da história recente, mas como quase tudo na presidência Trump, não está claro se a informação é verdadeira.

O aumento de verbas proposto se aplica às despesas normais do Pentágono. A administração, todavia, não declarou como tratará as despesas conhecidas como Overseas Contingency Operations (OCO), uma verba adicional do orçamento militar relacionada aos custos das intervenções no Iraque e no Afeganistão. O atual diretor de orçamento da Casa Branca, Mick Mulvaney, foi um grande crítico dessas verbas quando era congressista, uma vez que elas permitem que o Pentágono escape de restrições orçamentárias.

Atualmente, as verbas de OCO giram em torno de US$ 60 bilhões. Com tudo contabilizado, gasto militar do ano fiscal 2017 totaliza US$ 608 bilhões. Se Trump mantiver o valor anunciado de US$ 603 bilhões e não buscar apropriações extraordinárias, o novo orçamento verá uma diminuição real do gasto militar.

Mesmo sem considerar as despesas com intervenções no Iraque e no Afeganistão, a proposta de orçamento já vem sofrendo críticas da ala militarista do Partido Republicano. Trump declarou que a maior parte das novas verbas será investida com equipamentos e pessoal: a Marinha cresceria de 274 para 350 embarcações, incluindo a construção de dois novos porta-aviões; o Exército receberia recursos para 60.000 novos soldados; a Força Área ganharia mais uma centena de aeronaves de combate; e os Marines teriam 36 novos batalhões. O problema é que o orçamento previsto não tem condição de sustentar um crescimento militar como o proposto. John McCain, presidente do Comitê das Forças Armadas no Senado, e Mac Thornberry, presidente do Comitê da Câmara, já criticaram a proposta. Parte da comunidade de Defesa espera por gastos militares no montante de US$ 640 bilhões.

Diminuição do gasto não militar

A contrapartida destas discussões, e a outra parte do problema, é redução do gasto não militar. Os principais alvos da proposta são o Departamento de Estado, que teria uma redução de 37% em seu orçamento, e a Agência de Proteção Ambiental, com um corte de 24%. No caso do Departamento de Estado, os principais cortes viriam dos programas de ajuda externa. Em entrevista, Mulvaney declarou que os EUA iriam parar de gastar dinheiro no exterior para gastar em casa. Novamente, críticas surgem dentre os próprios republicanos. O líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, declarou ser contrário a cortes drásticos no Departamento de Estado. O senador Marco Rubio ressaltou a importância dos programas de auxílio externo para a segurança dos EUA. E Lindsey Graham, um dos maiores críticos de Trump, disse que a proposta nasceria morta no Senado.

No caso da Agência de Proteção Ambiental, os cortes seguem o objetivo declarado da administração de rever várias dos regulamentos aplicados pela EPA durante o governo Obama. No fim de fevereiro, Trump assinou ordem executiva alternado a maneira como a Agência trata as vias navegáveis nos EUA. Mas a tentativa de rever regulamentos ambientais e climáticos vai além da EPA. A proposta de orçamento também inclui cortes de 17% na National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), órgão que é parte do Departamento de Comércio. A NOAA é responsável, entre outros, por programas de monitoramento ambiental via satélite que fornecem dados para estudos de aquecimento global.

As propostas são tão polêmicas que até mesmo membros da administração Trump já declararam que vão brigar por reduções menores junto à Casa Branca. Scott Pruitt, o novo administrador da EPA, declarou que vai tentar defender alguns programas da Agência de cortes. O novo secretário de Interior, Ryan Zinke, também disse não estar satisfeito com os cortes.

Perspectivas

Do que foi divulgado até o momento, algumas conclusões podem ser tiradas da proposta de orçamento e dos objetivos da administração Trump:

  1. A conta não fecha: o orçamento do Departamento de Estado e da Agência de Desenvolvimento Internacional (USAID) para 2017 foi de US$ 50 bilhões; o orçamento da EPA foi de US$ 8 bilhões. Mesmo cortes drásticos como os propostos nunca gerariam a economia de US$ 54 bilhões necessária para investimento no orçamento militar. O que esses cortes radicais parecem promover, na verdade, é uma agenda tradicional republicana de desmonte do estado regulatório. Outros alvos de cortes são programas como o AmeriCorps e o National Endowments for the Arts and the Humanities, iniciativas que custam centenas de milhões de dólares em um orçamento de US$ 4 trilhões. E quando perguntado sobre como pretende pagar pelo aumento do gasto militar, Trump recorreu a esperanças de melhoras na economia e na arrecadação.
  2. Ao não querer irritar ninguém, Trump vai irritar muita gente. A proposta de orçamento é baseada no aumento de gasto militar equilibrado por cortes nos gastos não militares. Essa equação deixa a atual trajetória do gasto público no país inalterada, para o desespero dos chamados falcões do orçamento republicanos que querem ver uma diminuição geral do gasto público. Além disso, Trump está cumprindo uma promessa de campanha de não mexer nos programas sociais e aposentadorias. Mas são essas exatamente as maiores despesas do governo que os republicanos vem tentando reformar há décadas, em especial liderados pelo porta-voz da Câmara, Paul Ryan. Ao não reduzir o gasto público e não reformar programas como Medicare, Medicaid e a Seguridade Social, Trump atrairá dissidências entre os republicanos.
  3. No Congresso, principalmente no Senado, os democratas podem ter uma posição mais forte do que inicialmente esperado. O Budget Control Act de 2011 estabelece limites gerais para o gasto militar e não militar. A proposta de orçamento de Trump quer ir além desses limites para despesas militares, mas para isso o governo terá que contar com votos democratas no Senado. Pode-se esperar que os democratas atenuem a quantidade de cortes em gastos não militares como elemento de barganha.
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